Traduzido e adaptado de 5 Ways to Develop Talent for an Unpredictable Future
Apesar dos títulos das notícias pretenderam induzir ao clique (clickbait) e o receio da Inteligência Artificial (IA) e da automação nas profissões, os dados são muito claros: tal como eu destaco no meu último livro “I, Human: AI, Automation, and the Quest to Reclaim What Makes Us Unique”, é mais fácil perder o seu emprego para um humano que use a IA do que para a IA, principalmente, se não utilizar a inteligência artificial. Assim, não se observam novidades para a era da IA; tal como as outras tecnologias disruptivas, a IA vai eliminar alguns trabalhos, mas por outro lado, vai criar novos, que exigem a mão dos homens.
Tal como mostra o relatório do Grupo Manpower, 59% dos funcionários consideram a IA como um criador de novos postos de trabalho. O problema é que as pessoas que foram substituídas pelas máquinas (por exemplo, gestores de lojas físicas) não têm acesso a todos os postos que são criados pela tecnologia (por exemplo, analista de cibersegurança, marketing digital, especialista em ética de Inteligência Artificial). Segundo o World Economic Forum, metade dos funcionários vão necessitar de requalificação até 2050, para que possam acompanhar as novas tecnologias, e estes números são anteriores ao boom da IA.
De acordo com as estimativas de Erik Brynjolfsson, um professor de Stanford, por cada dólar que as organizações gastam em tecnologias, é necessário investir cerca de nove dólares em talento e processos adjacentes, tais como identificar pessoal com as competências adequadas; permitir mudanças no processo de gestão e criar condições para que as pessoas explorem o seu melhor potencial. De facto, aquilo que eu e a minha colega Becky Frankiewicz notamos, aquilo que faz ou impede a transformação digital não é a tecnologia atual, mas sim o fator humano: o talento.
Portanto, aquilo que precisamos não é a requalificação ou mais qualificações, mas sim a formação inicial – isto é, temos de ser capazes de identificar competências de futuro e reinventar as carreiras profissionais, mesmo sem saber quais as profissões do futuro e as competências que vão ser exigidas.
Pré-qualificar a sua mão de obra para um futuro incerto
Como é que se consegue isto? Embora, não exista uma receita, até porque não existem dados sobre o futuro, podemos até extrapolar dados baseados em tendências macro históricas, assim como retirar lições dos recentes padrões económicos e capital humano, para deixar 5 recomendações gerais:
1) Foco no potencial
À medida que a vida útil das competências, conhecimentos e desempenho atuais diminui, é aconselhável contratar e promover colaboradores por aquilo que eles possam fazer, em vez de pensar naquilo que eles fizeram no passado. Isto implica dar prioridade às soft skills, como capacidade de aprendizagem, curiosidade, resiliência, e capacidade de adaptação, em detrimento das hard skills, como programação ou análise de dados. É necessário focar nos ingredientes fundamentais da empregabilidade, em vez das atuais competências técnicas ou a história do emprego no passado, as quais ainda dominam as técnicas de contratação.
De uma forma simples, podemos não saber quais as competências que precisamos amanhã, mas podemos assumir com segurança que quando as pessoas são curiosas, emocionalmente inteligentes, resilientes, focadas e inteligentes, estarão mais disponíveis para aprender o que é necessário para um bom desempenho e providenciar aquilo que a inteligência artificial não pode dar. Uma das vantagens do potencial é que nós temos métodos seguros para medir, ferramentas psicológicas, que podem ser utilizadas para desenvolver o potencial, em particular através feedback, que ajuda a identificar aquilo que os colaboradores são e o que deveriam ser (ver abaixo).
2) Oferecer feedback fundamental
Mesmo antes da chegada da IA, já se verificava muita confusão e mal-entendidos no que concerne o alinhamento do talento e o potencial das pessoas na escolha das melhores carreiras. Nos nossos dias, está tudo mais complexo, e a maioria dos colaboradores e gestores estão a pensar o que vão fazer no futuro, se toda a sua experiência e competência, e todo o tempo e dinheiro investido nas suas carreiras, vai ter alguma relevância, e onde.
Um feedback orientado por números (de avaliações, dados internos, e avaliações de colegas) assim como ajudar as pessoas a perceber de que forma é que os seus interesses e competências podem ser uma mais-valia para as empresas, é a chave mestra. Isto significa ver os gestores como agentes de talento onde a sua principal função é, proactivamente, nutrir o talento das pessoas, assim como aproveitar o seu potencial máximo. Lembre-se: a maioria das pessoas têm falta de feedback, e há uma parte do feedback que não produz resultados eficazes. O importante é dizer às pessoas aquilo que elas precisam de ouvir, mesmo quando não o querem ouvir, e acima de tudo, dizer algo que elas não sabiam e que as pode motivar.
Não é suficiente dar feedback sobre as falhas na formação, as organizações devem incentivar os colaboradores a desenvolver competências relevantes para a empresa, enquanto estas oferecem programas eficazes e impactantes que permitem desenvolver os conhecimentos essenciais.
3) Foco na expressão de talento
Em vez de apostar em especialistas ou forçar os colaboradores a grupos específicos, as organizações devem empenhar-se em expandir o talento dos colaboradores. Isto significa não brincar com os pontos fortes dos colaboradores, mas sim, ajudá-los a melhorar os pontos fortes, e torná-los mais versáteis.
Todos temos uma tendência natural a adaptar o mundo às nossas competências de modo a fazer mais em menos tempo, e otimizar para uma eficácia preguiçosa em vez de alargar os objetivos ou a aprendizagem de novas competências. Na verdade, a não ser que os colaboradores estejam no topo da sua área de especialização (que por definição, só se aplica a um número restrito de indivíduos), terão mais utilidade se souberem fazer de tudo, até porque com cada nova tarefa ou competência que surja, haverá muitas competências subjacentes adjudicadas a outras tarefas, empregos e carreiras.
Tudo isto vai potenciar a diversidade e inclusão. Tal como nos dizem os professores de Harvard Joseph Fuller, Christina Langer e Matt Sigelman do Instituto Burning Glass: “a mudança para uma contratação baseada nas competências vai dar oportunidade a um grande grupo da população, que nos últimos anos foram excluídos por falta de formação académica.” Se as empresas se queixarem sobre a dificuldade em encontrar talento diverso e criativo, então, devem deixar de olhar para o talento da mesma forma que o faziam em tempos idos.
4) Investimento em gestores intermédios
Tal como eu e a Amy Edmondson verificamos, os gestores são responsáveis por desbloquear o capital humano no local de trabalho, principalmente, quando o desafio é revitalizar, energizar e reconstruir o talento. Mesmo antes da IA, o papel dos gestores intermédios era muito importante e correspondia entre 30% a 40% do desempenho da equipa, mas essa função complexificou-se em massa.
Historicamente, o gestor era alguém que tinha provas da sua competência técnica e revelava um desempenho passado muito forte. Nos nossos dias, os gestores devem perceber não apenas as tarefas clássicas de gestão (contratar pessoas, dar as orientações corretas, utilizar feedback para motivar os colaboradores e permitir um bom desempenho da equipa). Os gestores de hoje, também, são responsáveis por novos desafios mais complexos, como gerir equipas híbridas e virtuais, criar segurança psicológica, promover o DEIB (Diversidade, Equidade, Inclusão e Pertença), que inclui contratar e motivar os colaboradores que são diferentes dos outros. Para além disso, devem ajudar a gerir a era da inteligência artificial humana, incluindo todas as incertezas e o stress que isso possa causar.
Resumindo, nunca foi tão importante investir em gestores intermédios como agora, em particular, aproveitar as soft skills que muito provavelmente lhes vão permitir no futuro acompanhar os avanços da tecnologia e impulsionar a realização de valor que as suas empresas esperam com os avanços da tecnologia.
5) Investir em competências de liderança
Se está preocupado com um futuro alimentado pela IA, mas ainda considera que os humanos vão fazer parte dessa imagem, então deve preocupar-se em tornar os seus líderes capazes, pois eles serão os responsáveis por definir e vender a estratégia da empresa e impulsionar a evolução da sua cultura, num futuro incerto. Em parte, isto ainda significa promover indivíduos com as soft skills certas (conforme a etapa número 1) e o desenvolvimento dessas capacidades. Trata-se de seguir em frente e compreender que hoje os principais líderes mundiais podem ser uma fraca aposta para o futuro, não só porque o seu sucesso é baseado na réplica do que funcionou no passado, o que muitas vezes se assume como um obstáculo para mudar ou aprender coisas novas.
É importante ressalvar que investir em liderança significa aproveitar as competências que permitem uma colaboração efetiva por parte das pessoas e que as equipas se transformem em equipas de elevado desempenho. Não se trata de promover indivíduos para posições seniores ou estatutos gloriosos, muito menos se trata de concursos de popularidade que geralmente têm subjacentes indicações de “elevado potencial”. Significa saber quais as qualidades que as pessoas devem possuir para inspirar, motivar e trazer outros indivíduos para um mundo que conta com a IA, mas que, idealmente, deveria ser definido com a era da IA humana. Este é o grande desafio da liderança dos dias de hoje. Se as organizações conseguirem atualizar os seus sistemas de seleção de líderes, abandonar as réplicas de perfis de sucessos passados e selecionarem e acarinharem competências do futuro, todos os demais desafios serão facilitados. Em particular, isto significa abandonar a postura agarrada ao ajuste cultural, desempenho do passado e competência técnica, para se focarem mais na capacidade de aprender, curiosidade, integridade e nas competências pessoais. Mais importante, se as organizações estão, verdadeiramente, interessadas em aproveitar a diversidade, devem dar prioridade a uma liderança mais inclusiva e à diversidade cognitiva, quebrando a homogeneidade dos perfis de liderança.
A tecnologia está sempre a mudar, mas temos de assegurar que essas mudanças são uma verdadeira evolução (por exemplo, contribuem para o progresso), temos de fazer os esforços possíveis que permitam aos humanos desenvolver e implementar talentos relevantes para colher possíveis benefícios da tecnologia. Embora, tudo isto seja sem sombra de dúvida dado como garantido, não devemos perder a esperança e confiança na capacidade da espécie humana de se adaptar às suas próprias invenções tecnológicas.