Como gerir a paranoia do trabalho a partir de casa

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A Martina andava em torno da secretária, preocupada, enquanto roía as unhas. “Já passaram três horas desde que enviei o email ao diretor sénior e ainda ninguém respondeu. Devem pensar que eu não cumpri com a proposta de estratégia. Aposto que estão a trocar mensagens e a gozar comigo.”

Apesar do tumulto interno que vivia, a Martina não tinha qualquer evidência que a levasse a estar assim. Tinha sido recentemente promovida a vice-presidente do seu departamento, depois de vários desempenhos brilhantes.

No entanto, a Martina estava a ser consumida pela paranoia, um estado de medo durante o qual uma pessoa interpreta erradamente situações ambíguas, vê significados negativos e potenciais ameaças. Por outras palavras, a paranoia provoca uma irracionalidade analítica sobre nós próprios e sobre o comportamento dos outros. Tornamo-nos hipervigilantes, na procura pela reprovação ou rejeição, para a qual não temos provas objetivas.

A paranoia pode levar a preencher o vazio quando alguém não responde ao nosso email ou mensagem, assumimos que o nosso trabalho está fraco. Quando um colega está emergido num projeto, se calhar vai ficar preocupado que ele assuma a liderança ou que agradeça o trabalho em equipa. E quando o seu chefe lhe pede para não estar presente numa reunião, é porque ele não acredita em si ou simplesmente porque o quer proteger.

Mesmo antes da pandemia, os trabalhadores em trabalho remoto já reportavam sentirem-se desamparados e postos de lado. Mas agora, com o aumento do isolamento, mais trabalho, e mais stress do que nunca, não admira que os sentimentos paranoicos subsistam. Isto é particularmente verdade para os mais empenhados, um trabalhador de alto desempenho que vê o mundo de forma muito profunda. Quando vivemos momentos de stress, a nossa perceção pode-se transformar em pensar demasiado e em auto dúvida.

Pode ser, particularmente, difícil interpretar a linguagem corporal, expressões faciais, e as nuances do feedback à distância. E estar sozinho no escritório em casa pode levá-lo a ficar preso ao seu próprio cérebro e a dar voltas à cabeça. Sem os comportamentos de aprovação que se vivem no escritório é muito fácil ser negativo.

Embora o trabalho remoto levante algumas questões difíceis, é perfeitamente possível libertar-se da paranoia. Aqui ficam algumas sugestões para acabar com a suspeição irracional e dedicar-se ao que faz de melhor, mostrar resultados.

Esclareça as expetativas.

Para evitar ideias preconcebidas erradas ou más interpretações, estabeleça proactivamente as suas expetativas com o seu chefe, colegas e os interessados sobre o estilo de comunicação, o modo como as decisões vão ser tomadas e assuntos delicados tais como lidar com conflitos e diferenças de opinião. Digamos que deve definir com o seu colega sobre quando e como é que o vosso contributo será dado a um projeto. Considera este colega muito consciencioso e muito pormenorizado. Também concorda que, nesta fase, está à espera de comentários precisos. Porque já calibrou as suas expetativas, está menos predisposto a tirar conclusões ou assumir que fez algo errado ou que os seus colegas vão atrás de si sempre que receba um documento com muitos tracejados a vermelho. Uma das formas de tornar as expetativas explicitas pode ser através de uma lista formal de aspetos para o trabalho em equipa, na qual são especificadas as linhas orientadoras para uma colaboração positiva (responder às mensagens num período de 24 horas, ouvir com mente aberta, falar por si, etc.). Uma outra ferramenta é estabelecer um manual do utilizador que define horários de trabalho, de que forma é que aprende melhor e as situações nas quais tem dificuldade.

Esteja atento ao incumprimento.

A paranoia pode levar a agradar as pessoas e a sobrecarregar-se. Como forma de se manter relevante e estar em sintonia, pode acabar por dizer sim a tudo, mesmo estar em reuniões que não são necessárias. Pode envolver-se em situações que apenas lhe dão a ideia de ter tudo sob controlo. De facto, não se consegue esconder nada a ninguém se essa pessoa for omnipresente. Mas este tipo de atitude é o caminho para o burnout.

O primeiro passo para inverter esta situação é analisar o seu horário. Veja quais as reuniões que pode eliminar ou cancelar. Considere delegar a participação em reuniões a um colaborador direto ou chefia direta, alguém que seja capaz de tirar notas e de lhe reportar o que se passou. Cortar desta forma pode ser doloroso. Se assim for, então é porque está no caminho certo para melhorar a sua tolerância pela ambiguidade e mudar a sua relação com o medo.

Despersonalize o medo dos outros.

Se é um lutador sensível, então os seus níveis de empatia estão abaixo da média. Esse nível de profundidade emocional pode ser um presente ou um fardo. Por um lado, tem a capacidade de sentir as necessidades dos outros e provavelmente tem um pulso forte no que toca à motivação. Por outro lado, pode levar demasiado a peito o comportamento dos outros. Por exemplo, pode mesmo levar um comentário insignificante demasiado a sério. A próxima vez que estiver dominado pela paranoia, canalize a sua parte empática para o bem. Ponha-se nos pés da outra pessoa e pergunte-se o que poderia ter levado a uma reação como aquela. Qual é a parte boa do seu comportamento?

A Martina utilizou esta estratégia quando a sua chefia direta parecia estar aborrecida com a falta de progresso de um projeto. Em vez de se aborrecer, ela calçou os sapatos do seu chefe e refletiu sobre o que é que o poderia estar a aborrecer. Rapidamente, percebeu que a reação do chefe não era devido a um fraco desempenho da Martina ou devido a algum erro. Em vez disso, o seu chefe estava assim devido a um dia intenso de trabalho, dividido entre os deveres familiares e o próprio trabalho.

Partilhe as suas ansiedades.

Uma vez que não há limites definidos, a paranoia pode invadir o seu tempo mais privado. Em boa verdade, quatro em cada cinco trabalhadores não conseguem desligar verdadeiramente durante a noite. Estes resultados sublinham a importância de desligar mentalmente e libertar-se das preocupações ao final do dia.

A estratégia favorita dos meus clientes é aquela que designo de “mochila”. Imagine que coloca as situações mais preocupantes numa mochila e deixa a mochila num canto do seu escritório em casa. Em alternativa, desenhe um retângulo num papel e escreva as suas preocupações. Rasgue o papel e deite-o fora, simbolicamente, está-se a desligar do trabalho.

Enquanto estiver vigilante e sintonizado com o que está a acontecer no trabalho pode ser uma vantagem competitiva, mas se levada ao extremo pode-se desenvolver em paranoia e deixa-o paralisado. Com o esforço certo, pode gerir a sua mente eficazmente, mesmo com os desafios que o trabalho remoto pode impor.

Texto adaptado do artigo da autoria Melody Wilding, na edição da revista da HBR da edição de abril de 2021, e disponível em https://bit.ly/3C4kZcj.

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