Muitas vezes culpamos a tecnologia pelos nossos pioreshábitos, como a distração ou a má ortografia. Mas nossos telefones,computadores e gadgets também podem ajudar-nos a produzir bons hábitos se conseguirmospotenciar e tecnologia certa e a forma como deve ser utilizada. No limite, osdispositivos podem até ajudar a quebrar maus hábitos, se os usarmos para criarnovos hábitos que substituam os anteriores.
Afinal de contas, um hábito é apenas um comportamento que setorna um padrão: algo que estamos tão acostumados a fazer. É isso que torna osmaus hábitos tão perigosos (não podemos parar de praticá-los!); e os bonshábitos tão poderosos (não precisamos decidir continuar a fazer, pois emdeterminado momento, eles tornam-se automáticos).
Como Charles Duhigg aponta em The Power of Habit, um hábito“loop” é composto por três partes: a sugestão ou gatilho (o que quer quedesenvolva o hábito), a rotina (o próprio hábito) e a recompensa (o pagamentoque recompensa e reforça o hábito). As ferramentas tecnológicas podem ajudarcom cada uma destas componentes.
Gatilhos
A tecnologia é mais útil com a primeira parte desse loop,pois pode definir um alerta confiável que solicita o arranque ou início darotina. Para configurar lembretes úteis nos dispositivos:
– Escolher o contexto. Para desenvolver um hábito eficaz,considere onde e quando você quer que esse padrão aconteça. Se queremos começara usar o fio dental todos os dias, por exemplo, temos que decidir quando vamosfazer isso (depois do jantar? antes de dormir?) E onde (quarto de banho?). Crieuma fórmula como esta: “Em (hora e / ou local) a cada hora / dia / semanaeu vou …”
– Selecionar o tipo de lembrete ou alerta correto. Depois dedefinir a fórmula, é necessário criar o gatilho certo. Para muitos hábitos, olembrete é o tipo certo de sugestão. Podem ser cronometrados ou definidos combase numa localização específica. Por exemplo, se estamos a tentar que o foco ea atenção plena sejam hábitos, podemos criar um lembrete: assim que chegar aoescritório, local para respirar profundamente três vezes.
– Escolher o(s) dispositivo(s). Na maior parte do tempo, otelefone pode ser a ferramenta certa para o trabalho. Se o temos sempre o tempor perto, uma notificação pop-up (possivelmente acompanhada de um som dealerta) pode ser o acionador mais confiável, seja a função de lembrete dotelefone ou o gestor de tarefas ou aplicativo de calendário preferido. Muitosdesses sistemas são sincronizados entre dispositivos, logo é possível ter asnotificações ativas onde pretendermos.
– Ser criativo. Às vezes é preciso criar hábitos que sejamum pouco menos previsíveis. Podemos querer começar a comer um lanchehiperproteico a meio da manhã ou promover os posts mais recentes no Facebook,Twitter e LinkedIn assim que forem publicados. Ou podemos querer criar umaprática diária (como o diário), mas não conseguimos comprometermo-nos com umhorário específico todos os dias. Existem alguns tipos de gatilhos detecnologia que podem ajudar nessas situações:
• Aplicações de fluxo de trabalho como a IFTTT – If ThisThen That e a Zapier permitem configurar lembretes com base em gatilhos maiscomplicados. Por exemplo, definir um lembrete para transformar as suas reuniõesem “reuniões de caminhada” em qualquer dia em que não estiver achover ou um lembrete para sair do escritório mais cedo, se trabalhou até muitotarde na noite anterior. Consulte online os sites das aplicações: A IFTTT temuma lista de exemplos de lembretes relacionados com a saúde e bem-estar e a Zapier,por exemplo, disponibiliza uma lista mais geral que inclui algumas ideias sobrea criação de hábitos.
• Existem aplicações inspiradas na técnica “de cadeia” deJerry Seinfeld: para se motivar a escrever todos os dias, Seinfeld marcou umgrande X num calendário de parede após cada sessão de escrita e prometeu a simesmo que não quebraria a cadeia de Xs. O Consultor Vida Morkunas recomenda aaplicação Chains.cc como uma forma de acompanhar qualquer comportamento comouma cadeia.
• As aplicações de registo facilitam a anotação deinformações como, por exemplo, o que comemos, quando e como nos exercitámos ouquando concluímos tarefas de trabalho. Embora o uso de um log seja, por si só,um hábito, entrando no ritmo da extração de dados, o log acaba por se tornar umgatilho. Por exemplo, registar o consumo de alimentos pode ajudar a agendar otreino desportivo (se perceber que nos estamos a aproximar do limite diário decalorias); registar o trabalho concluído hoje pode ser o gatilho para detalharo plano diário de fim de dia para o que vamos fazer amanhã.
Rotinas
Depois de descobrir como ativamos ou estimulamos os hábitos,podemos começar a pensar em como a tecnologia pode apoiá-los a longo prazo.
-Identificar obstáculos. A tecnologia pode ser muito útil nodesenvolvimento de novos comportamentos através da superação de obstáculos pelaformação de hábitos. Seja qual for a mudança que queremos fazer, devemos pensarsobre as dificuldades para a formação de hábitos e considerar ou procurar comoobter informações ou suporte online que possam ajudar a superar esse problema(tutoriais no Youtube, por exemplo).
– Guiar o hábito. Cada vez mais pessoas usam aplicações paraorientar ou estruturar as rotinas de hábitos, especialmente quando se trata demeditação e exercícios. Se sempre quis meditar, mas não sabe por onde começarou como continuar, aplicações como o Headspace, o Insight Meditation ou o Calmpodem orientar em cada sessão de meditação. Mesmo as aplicações como o Inbox doGoogle têm ferramentas implícitas de formação de hábitos: se pretendermosresponder a cada e-mail assim que o lermos, as respostas clicáveis epré-fabricadas do Google Inbox poderão ser muito úteis.
– Tornar público. Se o hábito que queremos iniciar écriativo ou profissional, podemos descobrir que uma plataforma de rede social podeser o melhor contexto para executar a rotina. A consultora Channing Rodman, porexemplo, desenvolveu a sua prática de escrita publicando ensaios diários noFacebook. Se queremos incrementar a nossa rotina de escrita, de fotografar oude comunicar mais frequentemente com colegas, podemos consegui-lo através deuma plataforma de rede social e de uma aplicação para dispositivos móveis quefacilite os posts e que seja fácil e agradável de utilizar.
– Encorajar. Às vezes, a formação de hábitos é difícilporque o hábito em si é algo de que não gostamos, especialmente quando é novo edesafiador. Nesses momentos, a tecnologia pode ajudar a potenciar o incentivoem tempo real para continuar – talvez agendar uma data diária no Skype com umamigo para fazer uma tarefa pouco interessante; ou um incentivo através deaplicações de exercício físico que incentivam a competição, etapas e metas dosobjetivos definidos, mesmo em comparação com os amigos.
– Distrair. Às vezes precisamos de desenvolver hábitos quesão realmente chatos. Uma distração promovida pela tecnologia pode ser a nossa melhoramiga. Por exemplo, encontrar um audiolivro viciante ou uma playlist motivadorapode ajudar a manter uma rotina regular de exercício físico.
Recompensa
A recompensa é o que transforma uma ação repetida numhábito. Quando construímos uma associação entre fazer algo e obter algum tipode recompensa imediata, treinamos o nosso cérebro para angariar esse compromissode hábitos. A tecnologia também ajuda aqui, seja fornecendo uma recompensaimediata ou oferecendo outros tipos de reforço. A chave é saber o que temotiva, então podemos selecionar uma recompensa com tecnologia que realmentefuncione.
– Analisar o progresso. As mesmas aplicações de registo quepodem servir como gatilhos também podem servir como recompensa. Às vezes, osimples ato de registar uma atividade como concluída pode provocar pressa desatisfação. Existe um conjunto de aplicações de registo de hábitos que podemfuncionar para este fim.
– Subir de nível. Habitica pode ser uma app particularmenterecompensadora: é um gestor de tarefas e um rastreador de hábitos projetadopara se sentir como uma personagem de um filme ou de um jogo. Podemos ganhardinheiro virtual quando completamos tarefas e rotinas, e podemos usar essedinheiro para comprar várias recompensas na aplicação.
– Colecionar elogios. O guru Kim Werker usa essa estratégiasempre que está a tentar desenvolver uma nova prática criativa, publicandofotografias do seu trabalho em curso no Instagram; a reação entusiástica e oincentivo de colegas é a melhor maneira de recompensar e reforçar o progresso.Se achar que o elogio é motivador, faça da partilha social uma rotina.
-Mimar-se. Pequenos luxos e prazeres podem funcionar tambémcomo recompensas. Está a tentar esvaziar a caixa de correio todos os dias? Sempreque o conseguir, ofereça-se cinco minutos de navegação no Instagram. Seja o quefor, não pense que essas recompensas são um tempo “desperdiçado”: se elasajudarem a desenvolver e a sustentar um hábito valioso, valerão muito a pena.
Quebrando maushábitos
Os truques tecnológicos que podem ajudar a formar bonshábitos são igualmente úteis quando se trata de quebrar maus hábitos. Issoporque, como explica Duhigg, a melhor maneira de quebrar um mau hábito ésubstituí-lo por um bom hábito. Quer deixar de chegar atrasado às reuniões? Useos seus dispositivos para acionar ou recompensar a si próprio por chegar cincominutos antes.
A realidade é que a tecnologia é agora central para muitasdas nossas rotinas de hábitos. A razão pela qual passamos muito tempo preocupadoscom nossos telefones e computadores é porque a tecnologia facilita odesenvolvimento de novos hábitos indesejáveis.
Mas as mesmas qualidades que tornam a tecnologia uma zonaperigosa para o desenvolvimento de maus hábitos também a tornam uma aliadamuito promissora para o desenvolvimento dos hábitos que desejamos. Aprenda ausar a tecnologia para desencadear, promulgar e recompensar os seus hábitos, e podetornar-se uma máquina formadora de hábitos. Talvez a sua tecnologia possa ajudara desenvolver um dos hábitos mais poderosos de todos: usar seu telefone,computador ou outros gadgets de maneira mais intencional e menos compulsiva.
Texto adaptado do artigo da autoria de Alexandra Samuelpublicado no dia 27 de março de 2018 no hbr.org