Pergunte a alguém como é que se está a sentir ultimamente, e vai verificar que há uma elevada probabilidade de responder que está exausto. Estamos cansados de lidar com a incerteza. Estamos cansados de viver entre o trabalho e os cuidados a prestar aos filhos. Estamos cansados da falta de pessoal e de problemas na cadeia de fornecimento.
Quando nos sentimos assim, o nosso cérebro só quer guardar energia mental, orientando o foco para aquilo que está pronto a utilizar, utilizar informação que nos ajuda a tomar decisões rapidamente. Normalmente, fazemos isto instintivamente ou então tentamos ao máximo adivinhar.
A isto denominamos preconceito de conveniência, ou seja, fazemos aquilo que nos parece certo, apressamo-nos a julgar, muitas vezes sem pensar nas variáveis todas. O nosso cérebro atua desta forma, pois é mais fácil processar ideias já existentes do que processar ideias novas. A este princípio a psicologia chama de fluência. Por isso é que para os falantes de espanhol é muito mais fácil aprender italiano do que japonês. Tal como explicado pelo professor de marketing, Adam Alter, muitas pessoas pensam que ter duas notas de um dólar tem mais valor do que ter uma nota de dois dólares.
O que acontece é que muitos de nós estão, naturalmente, inclinados a fazer aquilo que nos parece certo, seja pedir às pessoas para regressarem ao escritório ou assumir que toda a gente quer uma semana de quatro dias de trabalho. O princípio Hedónico também entra aqui, estamos muito mais disponíveis para as coisas que nos satisfazem do que as coisas que nos causam algum tipo de desconforto. O nosso cérebro identifica o esforço negativamente, pois isso significa trabalho intenso. O cérebro assume aquilo que parece ser o normal, as redes dizem-nos como e onde viajar ao longo da nossa existência diária. Estas redes estão tão enraizadas no nosso pensamento que quando surge algo novo, independentemente de o caminho ser novo ou desafiante, o cérebro agarra-se sempre ao que já viveu.
No entanto, sabemos que as ações mais complicadas podem trazer benefícios tremendos, alguns dos quais podem não ser visíveis durante algum tempo. Imagine, começar um novo exercício físico. Eu posso até pensar que se eu conseguir correr uma milha, vou conseguir ter mais energia para brincar com os meus filhos. Tudo isto gera um ímpeto para agir. Ou talvez até foi o médico que exigiu esta mudança na nossa vida, ou um simples incentivo que nos estimula.
Mas algo surpreendente pode acontecer. Quando começamos essa nova rotina de corrida, não nos sentimos bem. Nem tão pouco na segunda, ou a terceira. Sentimos os músculos doridos. O dinheiro que gastamos no nosso novo passatempo cria algum desconforto no seio familiar. O horário tira-nos qualidade de tempo com os nossos amigos. Há uma série de variáveis que pesam e que nos fazem acreditar que deveríamos voltar à nossa rotina antiga; quando não sentíamos dores nos músculos, quando íamos beber um copo com os nossos amigos, quando não discutíamos com o nosso parceiro sobre os cem euros que gastamos no ginásio.
Então, como é que resolvemos a questão? Como é que fazemos as coisas mais difíceis se o nosso cérebro nos está sempre a dizer para evitar o esforço?
Em primeiro lugar, devemos fazer as coisas mais difíceis quando estamos de bom humor. Um estudo de 2016, mostra que as pessoas são menos capazes de fazer coisas difíceis quando estão de mau humor. No entanto, quando se sentem bem, têm mais facilidade em fazer as tarefas essenciais que os fazem sentir melhor. Uma forma de nos orientarmos no bom caminho é fazer aquilo que se chama reavaliação. Nesta reavaliação conseguimos mudar o nosso cérebro sobre o modo como percecionamos a tarefa. A reavaliação pode ser imensamente eficaz, quando escolhemos uma palavra simples que nos indica onde queremos estar. Por exemplo, ao dizer, literalmente, a si próprio, “Vou-me sentir muito melhor depois de ter isto feito,” pode ser o suficiente para retirar o seu cérebro do modo ocioso.
Em segundo lugar, devemos dar ao cérebro autonomia suficiente. Quando temos escolha, o nosso cérebro escolhe sempre o caminho mais fácil. Mas podemos mitigar essa resposta ao desafiar-nos a ser inovadores e dar incentivos para isso. Um exemplo simples, em vez de se debater com a ideia de fazer uma refeição saudável, que tal pensar: será que eu quero esta salada saudável que me vai dar a energia que eu preciso ou prefiro o donut que me pode deixar maldisposto e sonolento, tal como aconteceu da última vez que o comi? Se passar para um contexto profissional, quero experimentar uma nova ferramenta de gestão que pode tornar a vida da minha equipa mais fácil, ou prefiro manter sempre a mesma folha de excel que alguém definiu e que nenhum de nós gosta, particularmente.
Finalmente, podemos habituar-nos às coisas mais difíceis se praticarmos uma mentalidade de crescimento, e perceber quando é que voltamos às antigas formas de pensamento e comportamento. Para desafiar os padrões ou sistemas que inibem os novos hábitos de se enraizar, é necessário o apoio dos outros. Uma forma de o fazer, é partilhar situações em que se tentou, numa situação em que são premiadas as tentativas, mas também os resultados. Por exemplo, uma equipa de gestores tentou, recentemente, não ter reuniões de manhã para conseguir fazer o seu trabalho. Alguns destes tiveram sucesso, enquanto alguns preferiam fazer o trabalho mais exigente durante a tarde. Um mês depois de dar início à experiência, a equipa percebeu que não estava a funcionar, por causa dos fusos horários e optaram por uma tática diferente; deixar as segundas-feiras de manhã sem reuniões. Ao reconhecer o progresso feito ao tentar uma nova forma de estar, a equipa reunia condições para continuar a tentar coisas novas, em vez de se agarrar aos velhos hábitos.
Fazer coisas que nos deixam pouco confortáveis, como trabalhar arduamente, pode até parecer contraintuitivo. Mas ao perceber o que se passa com o cérebro, em vez de dar sempre razão ao instinto, conseguimos tratar das coisas mais difíceis e lidar melhor com os nossos medos.
Texto adaptado do artigo da autoria de David Rock, da edição da revista da HBR da edição de dezembro de 2021, disponível em https://bit.ly/3qcXXvQ.