Traduzido e adaptado de Johnathan R. Cromwell, Jean-François Harvey, Jennifer Haase, e Heidi K. Gardner.
Quando a OpenAI lançou o seu principal produto, o ChatGPT, no passado mês de novembro, alcançou um milhão de utilizadores em apenas quatro dias e 100 milhões de utilizadores em dois meses, alcançando este marco 75% mais rápido do que qualquer outro gigante da tecnologia. O ChatGPT continuou a evoluir rapidamente, tendo começado como um chatbot de Inteligência Artificial, cuja função era responder às questões dos utilizadores. Atualmente, já permite a análise de dados e a interpretação de imagens, impondo aos estudantes do ensino superior e executivos seniores uma luta para aprender a lidar com o ChatGPT e utilizá-lo de forma mais produtiva.
Embora o âmbito, escala e a velocidade do ChatGPT tenha um impacto único, o fenómeno que lhe está subjacente; uma tecnologia emergente capaz de transformar, consideravelmente, áreas de negócios e da sociedade, não tem o mesmo impacto. Mas o poder da tecnologia emergente exige uma nova abordagem. Ao contrário dos novos métodos de inovação, como o Design Thinking (o conjunto de métodos e processos para abordar problemas, relacionados com a aquisição de informações, análise de conhecimento e propostas de soluções), o ChatGPT apresenta um desafio fundamentalmente diferente porque não se percebe claramente os problemas a serem resolvidos; pontos problemáticos com necessidade de serem aliviados ou indicadores chave de desempenho a alcançar. De facto, o ChatGPT parece conseguir resolver problemas em quase todas as indústrias, domínios ou contextos. Por isso, usar o ChatGPT exige competências diferenciadas: pensamento emergente, que implica gerar ideias inovadoras sem compreender em profundidade o problema que tem de ser resolvido.
Recentemente, dois de nós (Jonathan e Jennifer) conduzimos uma pesquisa onde mostramos que o principal processo de pensamento para este tipo de inovação é começar pela compreensão das funções principais da tecnologia, depois explorar como é que isso pode ser utilizado para resolver problemas em diferentes domínios. Outra marca do pensamento emergente inclui a avaliação de ideias sem compreender o critério de sucesso, improvisar ideias sem grande preparação ou planeamento, e a alteração dos resultados alvo de um projeto.
Estas atividades têm tendência a ir contra boas práticas de negócios que promovem a eficiência e a confiabilidade, e podem, em última instância, violar alguns dos princípios básicos do Design Thinking, nomeadamente, a necessidade de identificar um problema de um utilizador a ser resolvido antes de gerar ideias para a solução. No entanto, eles também podem ser críticos ao tentar impulsionar o ChatGPT (ou outra tecnologia emergente) para a inovação.
Muitas vezes já começaram a integrar o ChatGPT nos seus produtos, processos e serviços. Ao analisar este crescente cenário de inovação, identificamos três caminhos de pensamento emergente para os gestores, que podem ajudar as oportunidades de uma implementação de sucesso do ChatGPT, enquanto evita potenciais armadilhas.
1ª regra: Explorar uma proposta de valor atual
A primeira regra implica utilizar o ChatGPT para explorar, ainda mais, uma proposta de valor que uma empresa já oferece aos clientes. Por exemplo, a Instacart aumentou a sua receita anual para US$2.5 biliões, quando apostou na entrega de produtos de mercearia de forma rápida, eficaz e acessível, em casa dos clientes. Recentemente, lançaram um Plug-in para o ChatGPT que lhes permitiu reforçar esta proposta de valor, ao aumentar a velocidade e eficácia das encomendas online. Com este Plug-in, os clientes podem receber sugestões de preparação de refeições, e quando encontrarem alguma coisa de que gostam, o ChatGPT vai criar uma encomenda Instacart, que automaticamente adiciona os ingredientes necessários para a confeção da receita.
Para seguir este caminho de inovação, comece a utilizar o ChatGPT sem direcioná-lo para um problema específico do cliente. Este processo de pensamento, pode ser desafiador pois a maioria da formação em negócios ensina-nos a ser pensadores estratégicos e a verificar a importância dos problemas dos clientes, passando horas a tentar encontrar soluções. Porém, começar com objetivos estratégicos como este, pode não permitir observar o potencial do ChatGPT para novas e valiosas aplicações. Em vez disso, comece por manter uma mente aberta e envolva-se profundamente com a ferramenta e com as suas principais funções. Assim que tiver essa compreensão, a cognição humana natural irá assumir o controlo e começará a fazer conexões de qualquer problema relevante que possa ter consciência.
Por exemplo, uma das principais funções do ChatGPT é interpretar e gerar textos em linguagem natural, capaz de fornecer respostas muito semelhantes às respostas humanas, para uma ampla variedade de perguntas e solicitações. As empresas podem utilizar essa função para aprimorar os recursos existentes de produtos ou serviços que se concentram especificamente em interações, com os clientes, com base em textos. A ferramenta de gestão de produtos Notion, atualmente, fornece aos clientes acesso imediato ao ChatGPT, com um simples toque na tecla de espaço, que ativa um lembrete que permite receber uma resposta da Inteligência Artificial, que por sua vez pode ser imediatamente integrada nas tarefas e fluxo de trabalho existentes. À medida que as funções do ChatGPT continuam a crescer, vão emergir novas possibilidades de como o utilizar para aprimorar, ainda mais, as propostas de valor de uma ampla gama de empresas e contextos.
2ª Regra: Expandir a Proposta de Valor
Uma segunda regra é utilizar o ChatGPT para expandir uma proposta de valor de uma empresa, resolvendo novos problemas aos clientes de forma a complementar a sua proposta atual. A Khan Academy, por exemplo, foi criada em 2006 com a missão de fornecer a todos os alunos uma educação gratuita, de nível internacional. Desde a sua criação, conseguiram quase 20 milhões de usuários por mês. Começaram por oferecer vídeos, curtos, e online que iniciam com uma tela em branco e são preenchidos com textos coloridos escritos à mão. Recentemente, integraram o ChatGPT na sua plataforma criando um tutor de IA personalizado, a quem chamaram Khanmigo. Esta ferramenta não só ajuda os alunos, como os orienta através dos vídeos online e a prática de questões mais eficazes, como também ajuda os professores ao explicar métodos de ensino e planificação de aulas.
Pode seguir este caminho, se deixar bem claro qual a perspetiva que vai seguir e aprender a alterá-la. Para o pensamento emergente, este passo envolve dividir uma proposta de valor em três elementos fundamentais:
- Os objetivos que os clientes pretendem alcançar
- O contexto no qual os clientes pretendem alcançar os seus objetivos
- O público-alvo específico dos clientes
Quando estiver definido, o passo seguinte é avaliar como é que as funções principais do ChatGPT (ver 1ª regra) podem ajudar a expandir cada elemento nas novas direções. A Khan Acdemy, por exemplo, estava, inicialmente, interessada em ajudar alunos do 12º ano (objetivo demográfico) a aprender conteúdos segundo uma metodologia de auto-ritmo (objetivo), feito exclusivamente online (contexto). Ao utilizar o ChatGPT expandiram este objetivo aos estudantes, facilitando a aprendizagem online, quer através da prática da autorregulação, quer através de um tutor de IA. Também expandiram o público-alvo, ao incluir professores, ajudando-os a delinear objetivos diferentes até aí impossíveis.
Este processo de definição e expansão, em duas fases, oferece um conjunto de habilidades complementares ao design thinking, que normalmente encoraja as pessoas a pensar em soluções diferentes antes de convergir numa só. No entanto, com o pensamento emergente, vai aplicar as técnicas de brainstorming ao problema, e não à solução.
Este processo de definição e expansão em duas fases oferece um conjunto de habilidades complementares ao design thinking, que, normalmente, incentiva as pessoas a pensar em muitas soluções diferentes antes de convergir para a que vai ser implementada. No entanto, com o pensamento emergente, aplicam-se as mesmas técnicas de brainstorming ao problema, em vez da solução.
Durante este processo, é fundamental manter uma mente aberta e evitar resolver um problema demasiado depressa, o que pode ser desafiante fazer em condições de incerteza. O ChatGPT desencadeou um nível de pressão, sem precedente, sobre as empresas para agir rapidamente, ou então sofrer consequências dramáticas para a sobrevivência futura. No entanto, os estudos mostram que também é possível resistir a essas pressões e explorar uma gama mais ampla de opções de inovação. Para isso acontecer, deve trabalhar com colaboradores de confiança de modo a conseguir navegar na ambiguidade com mais eficiência e assumir, juntos, um maior número de riscos.
3ª regra: Explorar uma nova proposta de valor
O último passo a dar na utilização do ChatGPT é tentar explorar uma proposta de valor completamente nova para os clientes e algo que eles, ainda, nem sabem que precisam. Embora, isto possa ir contra os métodos tradicionais de inovação, está alinhado com o conselho mais comum para a criação de inovação. Quando perguntaram a Steve Jobs se a Apple tinha feito algum estudo de mercado, quando começou a desenvolver o iMac, ele respondeu que era muito difícil projetar produtos para grupos específicos. Esta sabedoria parece ter sido totalmente adotada pela OpenAI ao lançar o ChatGPT no mercado. Neste momento, está a descobrir inúmeras formas de o utilizar, em contextos diversificados, para atingir novos e imprevistos objetivos. Esse caminho para a inovação, representa a forma mais pura do pensamento emergente, que tem a maior incerteza e, portanto, deve ser perseguido com o maior cuidado.
O principal desafio surge quando se tenta convergir tudo num único problema para focar em muitos dos identificados durante o brainstorming de diferentes objetivos, contextos e dados do público-alvo (verificar a 2ª regra). Quando as organizações têm propostas de valor relativamente mais claras – como aumentar a velocidade dos pedidos online na Instacart ou melhorar a qualidade da educação online na Khan Academy – pode ser mais fácil filtrar problemas que parecem rebuscados ou improváveis de refletir as necessidades dos clientes. No entanto, quando as necessidades do cliente são desconhecidas e surgem a par da tecnologia, torna-se difícil para as equipas chegarem a um acordo sobre uma direção comum a seguir. Isto é particularmente desafiador, ao tentar incluir as diferentes perspetivas, fundamentais para a inovação, porque os elementos da equipa podem conduzir o projeto em direções diferentes, apesar das suas intenções de colaborar.
Com o objetivo de tentar ajudar a superar este desafio, deve-se procurar identificar uma analogia coerente que sumaria o valor nuclear da proposta de valor. Por exemplo, a Tome é uma start-up que utiliza o ChatGPT para ajudar os clientes a melhorar as apresentações de documentos online, vídeos e conteúdo digital. No entanto, em vez de destacarem os benefícios que esta aplicação pode ter, eles descreveram o produto como um “parceiro de narrativas de IA”. Este conceito simples ajuda a integrar muitas características diferentes, numa experiência de produto coerentes, para que criadores e clientes possam entender facilmente o seu valor. Ao criar uma analogia para o seu produto, pode evitar o desperdício de recursos valiosos, criando recursos que podem não suportar a proposta de valor principal e pode ajudar os clientes a desenvolver um modelo mental claro dos vários recursos e da sua utilidade.
O ChatGPT é uma ferramenta tecnológica sem precedentes, que tem potencial para gerar milhões de clientes em vários setores. No entanto, perseguir estas recompensas pode significar correr riscos altíssimos, pois estamos todos a entrar num território desconhecido com a IA e devemos aprender como usá-la de forma eficaz, para que possa ser aproveitada e obter resultados positivos em vez de resultados negativos.