Traduzido e adaptado de Temple Grandin
O facto de ter mais de 50 anos de experiência, quer em empresas, quer no meio académico, e por ser também autista, faz com que os gestores responsáveis da DEI muitas vezes me convidem para fazer palestras. Estas empresas são das áreas do aço, farmacêutica, computadores, produtos de consumo para gado e produção de gado, transporte e dos media. As chefias fazem-me sempre a mesma pergunta: o que é necessário fazer para tornar a equipa de trabalho mais inclusiva?
Este é um grande passo, pois todas as empresas estão a trabalhar para que as suas equipas de trabalho se tornem mais diversificadas, no que diz respeito a raça, equidade de género e pessoas com deficiência. Já é altura de aplicar essas mesmas estratégias a diferentes tipos de mentalidades. Isto vai permitir o aumento da criatividade, estimular a resolução de problemas e criar locais de trabalho mais coesos.
Diferentes tipos de pensadores no local de trabalho
Em primeiro lugar, as chefias devem estar conscientes dos diferentes pensadores que existem e de que modo é que podem beneficiar das diferentes mentalidades e competências que estes pensadores carregam. Tudo isto pode até parecer muito simples, mas na nossa cultura, em que predomina a oralidade, aqueles que são mais fortes visualmente são postos de lado.
Sou um pensador visual muito forte, o que significa que todos os meus pensamentos se assemelham a imagens, fotos realistas e pequenos vídeos, como por exemplo os do Tik Tok. A minha memória visual é um registo completo de imagens que surgem de memórias de lugares que visitei, filmes e fotografias que vi, e textos que traduzi em imagens. Por exemplo, quando me pedem para avaliar um sistema de gestão de gado, todo um conjunto de videoclips que já vi passam pela minha cabeça. Essas imagens são classificadas em categorias e tenho a capacidade de combiná-las com coisas novas. Com a idade e experiência, o meu vocabulário visual cresce, da mesma forma que uma pessoa verbal aprende ideias complexas através de palavras.
Os pensadores visuais como eu, processam a informação de modo diferente; nós utilizamos a técnica de resolução de problemas e perceção visual. Costumo recordar um momento do início da minha carreira em que a minha orientação visual me auxiliou na resolução de algumas questões relacionadas com o comportamento dos animais. O gado de repente parou e recusou-se a seguir em frente, o que provocou atrasos no trabalho e comprometeu os lucros. Os tratadores não conseguiram descobrir o que é que estava a causar este comportamento nos animais e começaram a utilizar métodos extremos, como bater nos animais ou utilizar megafones para os manter em linha.
Quando vi este fenómeno, juntei-me aos animais para ver o que é que eles viam. Os criadores de gados e outros funcionários acharam-me ridículo. Mas para mim, como pensador visual, pareceu-me que era o mais correto de se fazer. Eu imediatamente reparei nas pequenas coisas que tinham escapado aos criadores de gado. Sombras, reflexos, até mesmo algo insignificante como uma corrente ou um corte de tecido pendurado dentro da calha pode desacelerar o movimento dos animais. Era fácil de resolver, mas mais ninguém viu isso. Para mim, estes pequenos obstáculos eram evidentes. É assim que a minha mente funciona.
Eu não sou o único pensador visual. Na realidade, há mais tipos, com a sua perspetiva única e conjunto de habilidades: visualizadores espaciais. Esta característica foi identificada por Maria Kozhevnikov e a sua equipa de investigadores de Harvard. As pessoas como eu, que pensam através de imagens foto realistas, são conhecidas por visualizadores objetivos. Normalmente, somos bons na área do design, engenharia e mecânica. Também somos bons a lidar com animais e outras profissões manuais. Os visualizadores espaciais pensam de forma mais abstrata, estabelecem padrões e têm competências na área da matemática, programação e música. Temos abordagens diferentes para a resolução de problemas: os visualizadores de objetos conseguem perceber como é que os instrumentos funcionam, enquanto os visualizadores espaciais calculam o modo como devem funcionar. Eu estabeleço sempre esta analogia; os visualizadores de objetos fazem os comboios, e os visualizadores espaciais fazem-nos circular. Precisamos dos dois tipos de pensadores.
Um bom exemplo de uma colaboração de sucesso entre os diferentes tipos de mentalidades é a parceria entre Steve Jobs e Steve Wozniak, que desenvolveu o computador da Apple. O Steve Jobs desenvolveu um computador fácil e simples de usar, e o Wozniak fez o computador funcionar. De acordo com o seu biografo, Walter Isaacson, Steve Jobs pretendia uma experiência de utilizador perfeita. Wozniak, o técnico, queria muitos recursos, mas Jobs sabia que muitos recursos tornariam o computador mais confuso. Este é um exemplo de um pensador visual artístico a trabalhar com um parceiro mais orientado para a técnica e para criar um produto de sucesso.
Quando diferentes tipos de pensadores se juntam e reconhecem o valor das suas diferentes abordagens, pode-se alcançar um grande progresso. A psicóloga organizacional Anita Williams Woolley e os seus colegas em Harvard e Stanford realizaram um estudo no qual pediram aos visualizadores de objetos e aos visualizadores espaciais para navegar num labirinto estilo Pac Man. Algumas equipas eram constituídas por pares de pensadores do mesmo estilo, outras eram pensadores diferentes. O estudo permitiu descobrir que as equipas de pensadores mistos superaram as equipas homogéneas. Quando as equipas eram mistas, os pensadores espaciais tendiam a utilizar o joystick enquanto o visualizador de objetos acionava os controlos. Os grupos homogéneos tendiam a gastar mais tempo em conversas que não levavam a lado nenhum. (Se já alguma vez esteve numa daquelas reuniões intermináveis da empresa em que nada é resolvido, então sabe bem o que isto é). Acontece que mentes brilhantes não pensam da mesma forma e por isso têm a tendência a produzir inovações imponentes.
Como aproveitar diferentes tipos de pensamento
Em primeiro lugar, os líderes empresariais e os formuladores de políticas devem encorajar as escolas a abordar as questões dos pensadores visuais que não conseguem ficar parados ou não conseguem fazer a matemática abstrata, como álgebra, e por isso são excluídos do sistema educacional dos Estados Unidos. Thomas Edison estava no último lugar da sua turma e foi avaliado como “confuso” por um professor. Então, a sua mãe tirou-o da escola para que pudesse ser educado em casa. Nos dias de hoje, Edison poderia ter sido diagnosticado com Perturbação de Hiperatividade e défice de atenção (PHDA), tal como quase um em cada sete meninos americanos que parecem entediados na sala de aula e são rotulados de “perturbadores”. Estas crianças precisam de fazer coisas.
Temos de nutrir e investir nos alunos com aulas práticas, orientação, estágios e aprendizagem em áreas em que as habilidades visuais são essenciais. Aprendi a costurar nas aulas de economia doméstica, desenhando moldes e costurando figurinos para a peça da escola. Na aula prática, aprendi a construir coisas, e fiz os cenários para a peça da escola. Estas habilidades fundamentais preparam o meu futuro.
Os modelos de contratação também precisam de ser alterados. Como pensador visual com autismo, eu não teria sucesso numa tradicional entrevista de emprego, na qual ser articulado e olhar nos olhos das pessoas era importante. Para conseguir um emprego, deixo que os meus desenhos técnicos e fotos de projetos concluídos no meu portfolio, falem por mim. Eu não conseguia vender um emprego, simplesmente, descrevendo-o, mas impressionava os empregadores com aquilo que chamo de 30 segundos de Wow (surpresa), ou seja, uma apresentação visual do meu trabalho. Aprendi a vender o meu trabalho e não a mim mesmo. O mesmo é válido para credenciais educativas: por exemplo, eu não consegui passar nos requisitos de matemática para seguir a carreira de veterinário, mas devido à minha afinidade com os animais e à perceção do seu comportamento, agora dou formação a veterinários.
O mundo empresarial e o mundo industrial necessitam de todos os tipos de mentes. Há um crescente número de funcionários neuro diversos que foram fundamentais para a implementação bem-sucedida. Por exemplo, uma empresa que foi fundamental para o mais recente sucesso do rover de Marte foi a Forest City Gear, com sede em Illinois, que trabalhou com a NASA para criar as minúsculas engrenagens que giravam a camara. Eram precisas tolerâncias exatas para sobreviver às duras condições marcianas. Para executar, foi necessária uma atenção extraordinária aos detalhes. O candidato perfeito para o trabalho pode ser uma pessoa com autismo.
Hoje, assistimos a um esforço para criar empregos para todos os tipos de pensadores. O Dr. Ivan Rosenberg deu início a um programa único com o College of the Canyons em Santa Clarita, Califórnia, para formar estudantes autistas na gestão de equipamento metálico computorizado em diferentes unidades fabris. Estes estudantes possuíam as qualificações para trabalhar na Forest City Gear.
Os trabalhos altamente especializados exigem trabalhadores altamente especializados. Para estes programas funcionarem, temos de compreender que as acomodações não são favores especiais. Todos os trabalhadores, visuais e orais têm um desempenho de acordo com os seus pontos fortes.
Concluindo, o mundo dos negócios precisa de todo o tipo de pensadores. Quando eles trabalham em equipa e complementam as capacidades, são bastante eficazes. O primeiro passo das chefias é aceitar a existência de diferentes tipos de mentalidade.