Como ser um opositor inteligente

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Há uma boa razão para suspeitarmos das ideias novas: muitas são irrealistas. Mas com o tempo os gestores acabam por descontar tudo o que não é familiar. Eles põem de lado tudo o que constitui um desafio às suas premissas sobre o funcionamento do mundo, fazem juízos de valor estereotipados e criam culturas que limitam as suas escolhas.

O segredo para evitar estas ciladas é transformar-se num opositor inteligente – alguém que observa as técnicas de negócios que não têm muito sentido, que não está dependente de um grupo de pessoas com a mesma mentalidade, que sabem abraçar a diversidade e que está feliz nos bastidores. Vejamos o que é que isto envolve.

A armadilha da lógica dominante: procurar a dissonância

As decisões estratégicas estão ancoradas em modelos mentais que ajudam os decisores a dar sentido a uma realidade complexa. Os gestores aplicam estes modelos na tomada de decisões, refinando-os com o tempo. Este é um processo cognitivo natural que resistiu ao tempo.

O processo deve estar disponível para aceitar ideias contrárias, se todos construírem o seu próprio modelo, alguém vai surgir com um novo e melhor modelo ao longo do tempo. Inevitavelmente, avaliamos modelos de sucesso e adotamos o modelo de alguém com poder social. Aquilo que eventualmente pode acontecer é o surgimento de uma narrativa dominante que atrai cada vez menos escrutínio.

E é precisamente, quando se recebe a sabedoria, que surge a oportunidade para os opositores inteligentes. Um bom exemplo, é dado pelo Richard Fairbank, o fundador da Capital One, uma empresa que rompeu com a indústria do cartão de crédito. Grandes bancos como o Citi, o Banco da Américae Chase emitiam cartões para os clientes e angariavam novos clientes através de email. Os lucros subiram exponencialmente. A capacidade de crédito era avaliada pelos rácios de dividas e rendimentos, índices de crédito e pontuação em entrevistas. Aos candidatos com a pontuação acima da média eras-lhe oferecido um cartão de crédito com termos gerais.

Na década de 80, Fairbank estudava em Stanford, quando assistiu a uma apresentação sobre indústria. O facto de todos terem o mesmo prémio (a mesma taxa percentual anual e anuidade) nos cartões de crédito mesmo em negócios em risco, não fazia sentido para Richard. E ele apercebeu-se que os clientes de elevado risco estavam a ser bonificados pelos clientes de baixo risco. Para situações como estas, uma abordagem demograficamente direcionada, com termos personalizados, em princípio, traria um retorno mais eficiente. O negócio que ele criou, baseado nesta compreensão foi a Capital One, que rapidamente conquistou um grande número de clientes.

A armadilha do elitismo: Olhe para a multidão

Muitos inventores veem o seu sucesso como uma consequência da sua superioridade de discernimento, em vez de ser parte de um processo de mudança continua, no qual a indústria se modifica e com ela as preferências de tecnologias.

As sociedades de capital de risco são disto um bom exemplo. O objetivo destas sociedades é claro, querem encontrar empresas caseiras que a concorrência pôs de lado ou não tem acesso. É como procurar uma agulha num palheiro. Milhares de startups iniciam a atividade todos os anos, e é impossível saber qual será a próxima grande empresa. Aqueles que são mais atraentes são muito provavelmente os que mais atraem a concorrência, por isso o capital de risco é diluído.

As empresas de capital de risco respondem a este desafio agindo como se fossem corretores de informação, combinando informação da sua rede privada social e profissional. Tudo isto aumenta a possibilidade de acertar em bons investimentos, de duas formas. Em primeiro lugar, as ideias que eles têm são normalmente da rede pessoal de elite, por isso a taxa de qualidade é superior. Em segundo lugar, a competição é reduzida pois as relações da rede fazem com que se repitam as interações.

Devido à vantagem do pioneiro no que concerne esta abordagem, os últimos a chegar a Silicon Valley estavam condenados a ser os grandes perdedores da indústria do capital de risco. Mas uma empresa, Draper Fisher Jurvetson (DFJ),reparou numa fraqueza deste modelo: as ideias das pessoas nestas redes de elite tendiam a convergir uma vez que as redes não mudavam muito, o que os mantinha presos a experiências anteriores e por isso menos suscetíveis para avaliar novas ideias e de modo diferente do que já tinham feito.

A DFJ evitou a armadilha quando se focou nos campos que as operadoras não tocavam e adotou uma abordagem mais inclusiva na identificação e avaliação de projetos. Quando a nanotecnologia surgiu no início do século, a DFJ prometeu, publicamente, avaliar cada uma das propostas submetidas, uma abordagem que contrastava profundamente com a abordagem mais tradicional e segregadora.

Claro que a DFJ reconheceu que o seu modelo apresentava desafios operacionais; o processamento do volume de propostas era caro e demorava tempo. Mas resultava em eficácia, o que era algo que a DFJ podia explorar. O acesso a muitos projetos criou um efeito de sabedoria múltiplo e a DFJ tinha a capacidade de ver áreas da nanotecnologia que os investigadores independentes se focavam, o que aumentava as possibilidades de identificar as próximas grandes tendências da nanotecnologia e eventualmente a startup vencedora nesta área.

A armadilha estereotipada: Abrace a diversidade e a experimentação

Uma coisa é reconhecer o que está errado com a lógica dominante. Também tem de criar uma estratégia baseada nas novas premissas e teorias. Isto requer pessoas que introduzam modelos mentais suportáveis, o que é uma das principais razões para as empresas beneficiarem do trabalho e criarem uma mão-de-obra diversificada.

A armadilha aqui é que as empresas pensam que conseguem resolver problemas complexos ao recrutar os melhores indivíduos, tendo em conta critérios objetivos. Esta crença mantém-se quando falamos de tarefas relativamente limitadas, mas se for o contrário, o recurso cognitivo de um individuo é muito mais útil quando produz ideias ou perspetivas diferentes das que existem na sua equipa. Por exemplo, ao contratar para a Capital One, Fairbank explorou o “poder de uma visão objetiva e ignorante do mundo, de alguém que nada sabe sobre cartões de crédito.”

Os estranhos à Capital One provavelmente deram-lhe isso. A equipa fez uma experiência na qual a empresa aceitou apenas os candidatos com as pontuações mais altas nas entrevistas e os que tiveram pontuações mais baixas e fez o rastreio do registo dos reembolsos dos dois grupos. Não encontraram diferenças estatisticamente significativas ao longo de três anos, após a aprovação do cartão, confirmando a ideia de que as entrevistas não são necessárias nem informativas.

Fairbank e a sua equipa suspeitaram que as entrevistas tornavam-se presas para o desenvolvimento de preconceitos estereotipados: mulheres, pessoas de cor, imigrantes eram por norma rejeitados para atribuição dos cartões de crédito devido às baixas pontuações nas entrevistas, ainda que pudessem ter uma boa pontuação nos índices financeiros. Tudo apontava para uma oportunidade; visava os candidatos que iam contra os estereótipos com uma relação divida/ rendimento decentes e pontuações de créditos. Não só eram estes novos clientes bons para os créditos, mas também estavam dependentes da Capital One pois as outras instituições não lhes davam dinheiro. E quando outras empresas mudaram os seus processos, estes clientes mantiveram-se fiéis à primeira empresa que os recebeu.

Se queremos aproveitar a diversidade, temos de evitar a prisão ao consenso. Na DFJ, por exemplo, a empresa apoia o investimento se um dos parceiros sentir que a ideia é muito forte. Aqui parte-se do princípio de que se todos os parceiros concordarem com a ideia, então esta não é forte o suficiente e tem potencial para ser cobiçada pela concorrência de outras empresas de capital o que por sua vez pode reduzir o valor que a DFJ poderá captar do investimento.

A Valve, empresa que desenvolve jogos, tem uma abordagem muito semelhante. Contrata profissionais que desenvolvam ideias idiossincráticas sobre o que é um bom jogo e permite-lhes que dediquem o tempo necessário. As decisões sobre se devem desenvolver uma ideia baseiam-se numa regra tridimensional: Os gestores direcionam recursos e apoio a um projeto caso o inventor consiga convencer pelo menos dois colegas a desistir do seu projeto e a juntar-se ao seu projeto. Isto assegura que a empresa está a investir em jogos de elevada qualidade, porque a Valveos escolheu baseada na sabedoria de pelo menos três inventores que não se conformam com a opinião dos outros com facilidade.

A cultura da armadilha: Mantenha a distância

Os gestores também enfrentam pressões sociais para ir de encontro à cultura dominante, que por sua vez está enraizada no modelo mental dominante. Isto explica porque é que as indústrias estabelecidas apresentam oportunidades de paragem e essa paragem raramente as leva a algo já estabelecido. Esta armadilha parece ser fácil de evitar, mas o poder de uma cultura não deve ser subestimado.

Um estudo de uma empresa sueca de capital permite uma ilustração de tudo isto. Os consumidores gostam de obter bons retornos e não querem pagar taxas. Esperaríamos que os bancos e as instituições financeiras oferecessem pelo menos aos seus clientes as oportunidades para investir em fundos indexados. As ofertas iniciais das instituições suecas mostraram-se bastante populares uma vez que praticamente não ofereciam barreiras aos fundos indexados. Conseguem imaginar que estes projetos foram rapidamente imitados.

Isso não aconteceu. Os gestores de fundos suecos não gostaram dos fundos indexados: “As empresas consideraram uma vergonha introduzir um fundo indexado o que insultaria os seus gestores.” Havia uma lógica institucional reforçada dentro de um grupo exclusivo interrelacionado: a maioria dos gestores de fundos suecos estavam treinados para escolher ações e vencer o mercado. Esta crença partilhada e o risco de se desviar dela (ser rejeitado pelo círculo social) significava que a oportunidade lucrativa de introduzir fundos indexados tinha sido descartada; as pessoas preferiam fazer menos dinheiro a sacrificar a sua identidade.

Nestas situações, paga-se para ser um estranho. Quando Fairbank apresentou a sua visão sobre os cartões de crédito, aos grandes bancos, esta foi rejeitada por todos, o que os obrigou a procurar ajuda a outros. Eventualmente, negociou com a Signet, uma empresa bancária média, segundo o qual ele seria pago pelo lucro gerado pelos novos cartões de crédito dos clientes. Em troca, ganhou o controlo total do negócio dos cartões de crédito.

Texto adaptado do artigo da autoria de Chengwei Liu, na edição da revista da HBR da edição de setembro de 2021, disponível em https://bit.ly/3jW6wb3.

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