O excesso de colaboração está a afetar a produtividade

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Trabalho colaborativo – tempo despendido ao telemóvel, mensagens, videoconferências, aumentou cerca de 50% ou mais na última década e consume cerca de 85% do nosso trabalho semanal. A pandemia provocou um aumento ainda maior, com as pessoas a passarem cada vez mais tempo em pequenas reuniões, em videoconferências, tendo o tráfego de mensagens aumentado cerca de 65%. Para piorar esta situação, as exigências de colaboração entram pela noite dentro e começam de manhã bem cedo.

Estas exigências, que não são visíveis para os gestores prejudicam os esforços das organizações para se tornarem mais ágeis e inovadoras. E podem levar ao descarrilhamento individual das carreiras, burnoute declínio do bem-estar físico e mental.

Para responder a estes desafios e proteger os funcionários das exigências do volume de trabalho colaborativo, há organizações que que estão a tentar uma análise organizacional de rede. Por exemplo:

· Duas grandes organizações utilizaram esta análise para verificar dados das agendas de modo a identificar formas de reduzir o número de reuniões redundantes.

· Uma empresa de software focou-se em reduzir o volume de emails, tamanho e o número de pessoas a quem se enviava o mesmo email.

· Uma reconhecida empresa na área dos seguros utiliza esta técnica para identificar os funcionários mais sobre carregados e ensina-os a reduzir o excesso de trabalho.

· Um outro exemplo mais ambíguo, uma empresa de serviços implementou um botão de desligar durante 60 segundos. Depois de uns tempos particularmente difíceis, os trabalhadores podem pressionar um botão que dá a indicação de que estão num momento de reflexão. Durante esses 60 segundos, os trabalhadores praticam o mindfulness, embora isto nos leve a pensar se isto não será muito semelhante a fazer um curativo a um amputado.

Este foco na quantidade de exigências colaborativas tem falhas ao nível de dois condutores de excesso de colaboração: 1) a ineficácia e o custo cognitivo de estar sempre ligado; 2) as motivações pessoais que nos levam a entrar em trabalho colaborativo, muito rapidamente.

Reduzir a ineficácia da cultura de estar sempre ligado

O excesso de colaboração não se resume apenas a um problema de volume de trabalho. Também tem um lado invisível, mas igualmente contraproducente na parte cognitiva, pois implica estar sempre em mudança devido à diversidade das exigências. Uma colunista, Jennifer Senior, escreveu no New York Times, que o Covid criou uma série incessante de tarefas de curta duração, quer no trabalho, quer em casa, que muitos estão a tentar gerir. Os psicólogos cognitivistas mostram que o facto de simplesmente respondermos a uma mensagem implica um tempo de recuperação de aproximadamente 64 segundos. Tal como nos mostra Gloria Mark, Professora de Informática na Universidade da Califórnia, podemos demorar até cerca de 23 minutos para estar de novo concentrados na tarefa que estávamos a fazer, depois de uma breve interrupção. Com o tempo, as pessoas adaptam-se às pequenas interrupções, mas esta adaptação tem um custo; as pessoas que estão constantemente a ser interrompidas experimentam excesso de trabalho, mais stress, maior frustração, mais pressão e têm de se esforçar mais.

Infelizmente, o Covid trouxe mudanças que nos deixam angustiados. As reuniões demoram cerca de 30 minutos, em vez de uma hora, e na maioria obrigam a mais trabalho colaborativo durante o dia. As mensagens tornaram-se mais frequentes na troca de informações, e muitas vezes sobrecarregam as noites, por exemplo, uma empresa viu aumentar a troca de mensagens em cerca de 52% entre as seis da tarde e a meia-noite.

A nossa pesquisa sobre trabalho colaborativo, ao longo das últimas décadas, mostra que os trabalhadores mais eficientes, são aqueles que têm mais impacto nas redes de trabalho e tomam menos tempo das pessoas, distinguem-se em parte porque sabem estruturar o trabalho e estão menos tempo disponíveis. Estas pessoas são normalmente mais eficazes (entre 18 e 24%) do que os seus colegas nas seguintes tarefas:

· Bloquear horas para trabalho reflexivo tendo em conta o próprio ritmo de trabalho. Para alguns, isto significa responder aos emails logo pela manhã, e depois ter umas horas disponíveis para trabalho que o próprio tem de fazer. Para outros, isto significa fazer trabalho mais criativo logo pela manhã e responder a emails, ao longo do dia, distribuído por três blocos de trinta minutos.

· Utilizar as regras de triagem no email. Email gera email, e todos temos uma tendência para querer responder rapidamente ao pedido que nos foi feito. As pessoas mais eficazes organizam os emails por categorias e respondem aos emails em determinadas horas do dia, em vez de permitir interrupções constantes.

· Fazer reuniões em pé para resolver a questão da equipa mais rapidamente. Os líderes mais eficientes marcam reuniões semanais para resolver situações pontuais, em vez de permitir pequenas discussões. Os elementos das equipas colocam dúvidas em plataformas como o Slackou Teams, e a equipa é encorajada a resolver o que for possível antes das reuniões. Com o tempo, os líderes percebem que os problemas isolados caem substancialmente, à medida que a equipa percebe a quem recorrer.

Ações organizacionais que podem reduzir os custos de transferência

Há muita coisa que as empresas podem fazer, ao nível organizacional, para reduzir a ineficácia dos custos de transferência que impedem os funcionários de ter sucesso. Por exemplo, quando a pandemia começou, o Zoom e o Slack tornaram-se ferramentas importantes de colaboração. A Uber monitorizou o uso destas ferramentas e observou que: 1) um aumento de 40% no número de reuniões e um aumento de 45% no número de participantes por reunião; 2) um aumento superior a três vezes mais em reuniões via Zoom e troca de mensagens no Slack. Estas interações reduziram em 30% o tempo de concentração (definido como duas horas extra por dia de tempo continuado que pode ser dedicado a uma tarefa ou projeto). Entretanto, a equipa da Uber descobriu uma forte relação entre o tempo de concentração dos funcionários e a sua produtividade, tal como medido nos questionários feitos aos funcionários. Os resultados mostram uma cilada de trabalho colaborativo em excesso, na qual as pessoas participam em muitas reuniões para serem produtivos. Estas reuniões acabam por afastar a concentração, o que por sua vez torna os funcionários menos produtivos.

A Uber descobriu que os funcionários tinham maior controlo do seu trabalho e melhoravam os sentimentos de bem-estar, quando tinham a perceção das ferramentas que precisam para ter sucesso. A empresa está a lidar com a sobrecarga do trabalho colaborativo através de uma abordagem de dupla informação e capacitação. Por exemplo, a empresa levou a cabo uma experiência no final de 2020, onde comunicaram o impacto do tempo de concentração na produtividade (assim como dicas para aumentar a concentração) a um grupo de funcionários e depois compararam o tempo de concentração destes com o de funcionários que não receberam esta informação. O tempo de foco aumentou moderadamente para o grupo informado. Numa outra experiência, implementaram uma aplicação que ajudava os funcionários a definir a quantidade de tempo de concentração que precisavam e depois otimizaram no calendário este tempo marcando reuniões de acordo com esse horário (um trabalho do género de uma assistente virtual). Tudo isto levou a um aumento de cerca de 20% do tempo de concentração do grupo experimental.

Embora seja ainda um estudo em andamento, os estudos da Uber mostram que é necessário informação e capacitação para combater o excesso de trabalho colaborativo. São necessárias informações para dar aos funcionários o campo de atuação, mas não são suficientes por si só, pois estes não oferecem um canal para a ação. São necessárias intervenções especificas, como por exemplo aplicação de tempo de concentração, o design do local de trabalho, para que se tenha um trabalho colaborativo mais eficaz. Mas os funcionários podem não utilizá-lo totalmente se não perceberem o contexto. Para se ver a diferença são necessários as ferramentas e o contexto.

À medida que 2021 avança, a Uber está a combinar informações de capacitação para ajudar os seus funcionários a colaborar de modo mais eficaz, melhorar o desempenho e o bem-estar. A empresa está a incorporar ideias e dicas sobre colaboração, oriundas das análises de pessoal e equipas, em reuniões e comunicações por toda a empresa, recursos de desenvolvimento de gestores e newsletters para funcionários. Ao mesmo tempo, dão às suas equipas ferramentas e aplicações.

O inimigo também está no espelho

As interrupções e os custos de transferência não são os únicos causadores do excesso de colaboração que as empresas perdem quando estão focadas nas exigências do trabalho colaborativo. Outra fonte critica de sobrecarga vem das motivações pessoais que resultam de cada um de nós, muito mais do que admitimos ou percebemos, e que criam problemas de excesso de colaboração tornando-se desnecessários. Quando as pessoas falam de excesso de colaboração, inevitavelmente atribuem a culpa ao email que está fora do controlo, ao número infinito de reuniões, às exigências dos clientes, e chefes irracionais. Mas os nossos estudos mostram que 50% das vezes, os maiores culpados somos nós mesmos.

Todos nos associamos a muitas colaborações, que acontecem em pequenos momentos quando nos fazem um pedido, ou quando vemos uma oportunidade na qual sabemos que podemos ajudar, mesmo sabendo que não deveríamos. A maioria das pessoas já se sentiu compelida a ajudar mesmo sabendo que deveria dizer que não, mas num milésimo de segundo convence-se de que o têm de fazer. As pessoas colaboram e seis semanas depois perguntam-se porque é que não têm tempo para fazer as suas coisas.

O nosso estudo, ao longo da última década, mostra que isto é o maior condutor de excesso de colaboração e a tendência mais difícil de mudar. Somos instigados a entrar em trabalho colaborativo, motivados por maneiras de trabalhar que conhecemos desde o tempo do liceu. E a verdade é que o excesso de colaboração é insidioso.

A sensação é boa, e estamos no terreno até não ser mais possível.

A nossa pesquisa descobriu que algumas motivações a que chamamos “estímulos de identidade”, que podem causar algum prejuízo. A chave está em identificar o nosso estímulo pessoal e desenvolver um mantra no momento certo para nos impedir de saltar. Um executivo de sucesso de Silicon Valley, que tem uma mentalidade profundamente enraizada na ajuda, aprendeu a repetir: “Dizer sim, significa dizer não” (a alguma coisa). Outro líder de sucesso de uma empresa próspera de produtos de consumo perguntaria “Sou a única pessoa a quem se pode pedir ajuda para este assunto?” As pessoas precisam de se proteger contra:

· Estímulos de identidade e reputação como o desejo de ajudar os outros, uma sensação de realização, um desejo de ser um influenciador e reconhecido, e a preocupação em ser um bom colega ou colaborador.

· Ansiedade e a necessidade de controlar os estímulos tal como o medo de perder o controlo de um projeto ou resultados, a necessidade de parar, de não gostar da ambiguidade e o receio de perder (FOMO= tipo de ansiedade social)

Ações organizacionais que podem ajudar a reduzir a sobrecarga pessoal

A General Mills tem mostrado como as organizações voltadas para o futuro podem ajudar a combater a sobrecarga causada pela ansiedade. A mudança para o trabalho remoto durante a pandemia assumiu-se como um desafio para a General Mills. Não só os colaboradores se estavam a habituar a esta nova forma de trabalho, mas a procura de produtos nucleares da Mills disparou à medida que as prateleiras dos supermercados ficavam vazias devido ao pânico das compras.

Tudo isto criou um ambiente de colaboração nunca antes visto na empresa. A média de tempo que cada funcionário passava, por semana, em trabalho colaborativo no início de março de 2020 era de 21.4 horas (baseado em dados internos da General Mills). No final de julho verificou-se um aumento das horas passadas em trabalho colaborativo em cerca de 20%, cerca de 25.7 horas por semana.

Quando a empresa combinou estes dados de colaboração com os dados de experiências dos funcionários, observaram que havia um crescimento do sentimento negativo entre os funcionários. Só deste modo, foi possível tomar ações preventivas de modo a evitar que o stress e o burnoutaumentassem.

Um exemplo concreto, da produção e profissionais da linha da frente, foi a chamada “Terça-feira de cuidados”. Este esforço semanal ajudava os líderes, através de lembretes direcionados, a ajudar e apoiar o bem-estar geral e a dinâmica da equipa. Cada mensagem focava aquilo que cada líder necessitava de saber e continha dicas rápidas sobre o que fazer, sendo que todas as semanas o foco alternava entre o tomar conta de si, dos outros e do negócio. Por exemplo, numa mensagem recente de uma das terças-feiras de cuidados, lembrava-se aos líderes que uma comunicação clara e consistente é essencial durante os tempos de mudança e ofereciam as seguintes dicas:

1. Conte uma história de modo que todos saibam onde devemos estar e onde é que estamos.

2. Continue a atrair corações e mentes partilhando porque é que a mudança é importante. E

3. Permita algum tempo para perguntas e reflexões.

Estes lembretes diretos, com ações praticas e links para recursos adicionais, numa cadência regular foram bem recebidos por líderes e funcionários.

Este foi um passo importante. Nesta altura de evolução do Covid, a maioria das organizações estavam preocupadas em envolver digitalmente os funcionários criando mais reuniões e emails. Por outro lado, a General Mills possuía dados analíticos que lhe permitiam perceber que isto estava errado. A correlação entre tempo fragmentado e depressão e fadiga dos funcionários era de 5.5, o que significa que o impacto do trabalho colaborativo, no bem-estar dos funcionários, era muito forte.

A solução passava por ajudar as pessoas a estruturar o tempo de forma diferente, em vez de convidar as pessoas para mais reuniões. Mas isto só não era suficiente, a General Mills continua a utilizar as informações para ajudar os indivíduos a gerir melhor as mudanças das exigências do trabalho colaborativo, principalmente quando as equipas se preparam para um ambiente de trabalho mais híbrido e flexível.

As ações chave que emergiram da análise dos resultados:

· A implementação de uma política de “Sexta feira livre”. Os funcionários foram avisados de que deveriam bloquear nas suas agendas as sextas feiras, a partir das duas da tarde, de modo a terem mais tempo para se concentrarem em trabalhos que exigem mais concentração, gerir emails e recarregar.

· A utilização mais frequente de questionários sobre o bem-estar dos funcionários. Estas ações orientadas surgiram da rápida cadência da capacidade de ouvir por parte dos funcionários. As ações desenvolvidas por causa destes questionários tornaram-se mais frequentes, lembretes da liderança a lembrar os funcionários da necessidade de priorizar apenas o trabalho mais importante e focar no autocuidado. Por exemplo, muitos líderes começaram a enviar mensagens de vídeo e a manter com maior frequência conversas com a sua equipa (e a empresa), durante as quais davam importância à necessidade de estabelecer prioridades, autocuidado e testar e aprender esta nova mentalidade.

· O desenvolvimento e implementação de ferramentas de “Modos de trabalho” para unidades com elevados níveis de colaboração, stress e humor negativo. As intervenções de “Modos de trabalho” começaram a dar informação aos líderes sobre o estado de colaboração e humor que se fazia sentir entre os funcionários e permitiram iniciar um diálogo sobre o modo como a organização poderia agir de modo diferente. De seguida, as reuniões para cada unidade, onde se ensinava praticas mais eficazes e modos de proteção contra o excesso de trabalho colaborativo.

Como resultado destas iniciativas, a General Mills conseguiu mitigar os riscos do excesso de trabalho colaborativo durante a pandemia e do trabalho a partir de casa e continuam com estas políticas. Para os grupos que receberam as sessões de “modos de trabalho” os resultados foram, particularmente, promissores. Em média, estas equipas da General Mills reduziram o tempo de colaboração a oito horas por funcionário. Ao mesmo tempo, estes grupos reportam uma redução no número de reuniões sem grande valor e observam-se reuniões mais organizadas, sem que tenham efeitos negativos nos níveis de stress e humor. Para além disso, as lições que estas equipas aprenderam estão a ser utilizadas noutras equipas e num trabalho mais amplo, com o objetivo de apoiar o bem-estar dos funcionários e ajudar todas as equipas da General Mills a colaborar de modo mais eficaz.

Olhar em frente

Os funcionários, de todos os níveis sentem a pressão do excesso de trabalho colaborativo e não se vê o fim disto. Quando bem utilizados, os dados analíticos podem ajudar a identificar a eficácia neste mundo super conectado. Levar as organizações a equipar os seus colaboradores com ferramentas que lhe permitam trabalhar com maior eficácia, só traz vantagens ao nível do desempenho e retenção de pessoal.

Texto adaptado do artigo da autoria de Rob Cross, Mike Benson, Jack Kostal e RJ Milnor, na edição da revista da HBR da edição de setembro de 2021, disponível em https://bit.ly/2YTlB5n.

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