
Sentimos alguma culpa por não termos trabalho neste artigo mais cedo, e agora, depois de feita a pesquisa e perante o que sabemos sobre a culpa e o quão prejudicial é, sentimo-nos duplamente culpados por, em primeiro lugar, nos sentirmos culpados, algo que definidos como meta-culpa.
Pedimos desculpa pela última frase. Sabemos que é uma pessoa muito ocupada e com pouco interesse na autocomiseração. Mas temos de admitir, agora que pedimos desculpa, também sentimos culpa por pedir desculpa. Todos os estudos dizem que os bons líderes, por exemplo, devem ser fortes, bravos e confiantes nas suas escolhas, e não autocríticos e apologéticos.
Consegue imaginar viver assim? Ou… se calhar não tem de ser assim.
A culpa, apesar de subtil, é uma emoção insidiosa, que muitos de nós experimentam diariamente. Alguns autores defendem que o perfeccionismo está no centro de tudo isso, mas mesmo aqueles que não são perfeccionistas não estão imunes à culpa. Outros defendem, que a culpa é uma perda de tempo, mas não devemos colocar nenhuma das hipóteses de lado.
A culpa pode ser um sinal de equilíbrio. Por exemplo, se num acesso de raiva chama o seu colega de inútil e põe sal no seu enorme mocha descafeinado, o sentimento de culpa é provavelmente uma emoção apropriada, e muito provavelmente, vai prevenir outros atos desonestos no futuro.
No caso acima, o crime é indiscutível, embora geralmente, a culpa seja mais traiçoeira. Quando estamos a trabalhar, sentimos culpa por não estarmos com os nossos filhos ou os nossos animais de estimação. Quando estamos em casa, sentimos culpa por não termos tratado da roupa da semana ou por não estarmos no trabalho. Aos fins-de-semana, temos um sentimento de culpa por não telefonarmos aos nossos amigos ou sair com os amigos em vez de estar em família. Durante o confinamento por causa do Covid_19, sentimos culpa por não termos aprendido três novas línguas e em vez disso estivemos a ver as nossas séries preferidas, o que acabou por nem ser sempre agradável por causa do sentimento de culpa que nos dizia que deveríamos aprender mandarim.
A questão é que sentimos uma pressão de estar sempre a fazer coisas, principalmente coisas que mostram que estamos a progredir. Quando não estamos, sentimo-nos culpados. Estamos constantemente a comparar as histórias de sucesso dos outros. Acreditamos que o nosso sucesso e falhanço estão sempre relacionados com as nossas ações, ou a falta delas. Por isso, a razão pela qual não atingimos o sucesso é porque não estamos a trabalhar o suficiente (ou então estamos no sofá com as nossas séries favoritas).
A pressão para ser o melhor no trabalho está sempre lá, mas também esperamos mais de nós noutras frentes; na nossa vida social (#omg – oh meu Deus – objetivos de amizade), a nossa família, a nossa saúde, a nossa aparência, enfim tudo.
A culpa não nos impede de fazer coisas, mas pode-nos fazer desperdiçar energia importante. Pode muito lentamente deitar abaixo a nossa autoestima, tornando mais difícil atingir os objetivos ou seguir em frente depois de retrocessos. Se não for controlada, esta situação pode levar a manifestações físicas, incluindo ansiedade e insónia. A culpa que sentimos quando não somos o funcionário perfeito, ou o amigo perfeito ou perfeito em alguma coisa é parcialmente imposto pela sociedade, mas a outra parte também é claramente autoimposta. O que parece, é que no geral nós somos os nossos próprios juízes, por isso, também devemos ter a capacidade de nos libertarmos. Declaro o réu inocente da culpa!
Tal como quatro mulheres com uma trajetória de carreira interessante (incluindo CEO e banqueiras sénior), nós fomos atormentados pela culpa durante muitos anos, e com plena consciência de que isto estava a esgotar a nossa energia. É sempre mais difícil identificar um problema do que o resolver. O que nos ajudou foi o código morse para a agitação (ou neste caso, para o stress): SOS.
O nosso Código ajudou-nos a estruturar o modo como podemos resolver um problema em três níveis diferentes: o que é que eu posso fazer, o que podem fazer os outros e o que pode a sociedade fazer. Sugerimos que comece a utilizar isto também.
O eu
Coloque a sua máscara de oxigénio antes de começar a ajudar os outros: a culpa é normalmente provocada por um sentimento de baixo desempenho. Quando estamos stressados a probabilidade de cair nas garras de tais pensamentos é maior. O primeiro passo para derrotar a culpa é tomar conta de si. Não pode ser tudo para todos (seja o seu patrão, amigo, esposo, pai, etc.), caso seja um demolidor nervoso. Durma. Não fique acordado até tarde porque entre a meia-noite e as duas da manhã, é a única altura em que as pessoas que lhe querem alguma coisa estão a dormir, e assim pode ter um momento para si. Crie momentos destes durante o dia, mesmo que sejam breves.
Se bloquear estes momentos na sua agenda e criar o hábito, não tarda e será algo natural. Os estudos e também o senso comum mostram que pessoas felizes são mais produtivas, melhores companheiros, têm casamentos mais felizes e, com sorte, menos propensos a sentimentos de culpa.
Priorizar: Todo o conflito de prioridades, está no centro da sensação de culpa. Quando decide dar um passo em frente, não questione a decisão. Respeite a pessoa que tomou essa decisão (o seu outro eu). Quando decide, fixe-se mentalmente à sua decisão. No trabalho, faça uma lista das suas tarefas atuais, e coloque-as por ordem de importância (eixo X) e urgência (eixo Y). Se é capaz de fazer uma estimativa ao tempo que demora cada tarefa, isso é muito bom. Se verifica que há tarefas que não são importantes nem urgentes, mas consomem tempo, então procure delegar essas tarefas, faça-as mais eficazmente ou então deixe de as fazer.
Peça ajuda. Muitas vezes estamos relutantes em pedir ajuda pois pensamos que vai minar a nossa autoridade, diminuir o nosso estatuto, ou simplesmente porque temos medo da rejeição. Os estudos mostram que pedir ajuda às pessoas para fazer alguma coisa, na verdade, faz com que as pessoas gostem mais de nós. (Parece-nos uma situação em que todos vencem) Ter menos coisas para fazer, vai torná-lo mais cumpridor e capaz de tomar conta das suas prioridades, e deixá-lo mais livre das vozes da culpa.
Outros
Não julgue: O seu perfecionismo pode estar a afetar as outras pessoas. Fazer pressão sobre o desempenho, pode fazer com que os seus colegas de equipa se sintam culpados por não o acompanhar. Se se sente frustrado com o desempenho de alguém no trabalho, lembre-se de que não sabe o que se passa com a vida privada dessa pessoa. Um benefício adicional para com os outros, é ser menos juízes perante as suas falhas, pois pode ajudar a diminuir o sentimento de culpa.
Sistema
Redimensione o que ensina e aprende: Os nossos ecossistemas educacionais, culturais e familiares deveriam deixar de ensinar “os rapazes a serem bravos e as raparigas a serem perfeitas”. Todos deveriam ser ensinados, desde tenra idade, a ter calma e não fazer nada de vez em quando, e desfrutar de um momento de quietude, sem sentimento de culpa. Por isso, se não aprendeu a fazer pão durante a pandemia, não há problema. Se não respondeu a todas as suas mensagens hoje, amanhã também é dia. Se se esqueceu de encomendar a mercearia a semana passada, faço-o agora. Deixe-se de sentir culpado por não fazer algo de útil a cada minuto do seu dia. Isso não é possível e também não é saudável.
Diminuir sentimentos de culpa é algo que se pode aprender, embora demore algum tempo. Mas quanto mais cedo começarmos, mais fácil será para as gerações futuras serem mais equilibradas do que a nossa.
Texto adaptado do artigo da autoria de Marijn Wiersma, Chantal Korteweg, Lidewij Wiersma e Tessel Van Willigen, na edição da revista da HBR da edição de setembro de 2021, disponível em https://bit.ly/3Du2lKL.